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ARQUIGRAFIA de linhas imaginárias



Gostaríamos de convidar a todos para participarem da deriva urbana fotográfica proposta pela rede social Arquigrafia, parte do III Seminário Representar, organizado pela FAUUSP, com apoio da FAPESP, NaWeb e RELAB. A provocação se dá na forma do texto abaixo, que resume a proposta:


Resumo da proposta:
É possível pensar, como propôs Heidegger (2002), que “o limite não é onde uma coisa termina mas, como os gregos reconheceram, de onde alguma coisa dá início à sua essência.”
É do limite para dentro que se conforma um objeto, um lugar, um conceito, uma palavra, uma imagem. Para fora desses limites há o mundo indistinto, o espaço sem lugares, uma extensão amorfa a princípio.
O muro temenos dá início ao santuário. A partir dele tem início uma epifania no espaço natural homogêneo. Ali habita um Deus e haverá altares e templos. Sempre encontraremos esse muro pelo lado de fora. Viremos sempre de fora para dentro. O muro períbolo delimitará uma linha cosmogônica do universo dentro do universo, como poderia dizer Focillon (1981).
Perambulando investigaremos esse interior antes com a imaginação, extensão sonhadora que antecipa e guia os sentidos. Depois, passado o muro, seguiremos imagin-vendo de dentro para ainda mais adentro. Na outra extremidade do dentro, depois do dentro mais profundo, do lado de lá estaremos novamente fora.
O horizonte de Brasília não é onde a cidade deixa de ser, mas a linha horizontal a partir da qual a cidade centrípeta converge para ser o que é, para além do que se imaginou que seria outrora.
Na tríplice fronteira entre o Brasil, a Argentina e o Paraguai, no encontro dos rios Paraná e Iguaçu, o que surpreende é a surrealidade da semelhança. Naquela natureza tripartida, artificial é a cisão que não convence nem a imaginação nem os sentidos. Postos em um dos vértices estamos onde poderia estar o outro, triplamente espelhados. Talvez daí Borges tenha intuído a condição onírica de ‘O Outro’, deslocada inadvertidamente (ou especularmente?) para as margens setentrionais do rio Charles, ao norte de Boston, em Cambridge.
Ali onde o marco indica que passa a linha do Trópico de Capricórnio, do Equador ou de Greenwich surpreende a indiferença da natureza quanto a um lado e o outro. Prova disso são os pássaros e as crianças que cruzam por ali resolutos e absolutamente distraídos.  
A dialética da fronteira se posta firme na oscilação paradoxal da (des)continuidade. Início ou fim, inferno ou paraíso, tangível ou inapreensível, interior ou exterior?  
A linha d´água da baía de Santos era para as naus portuguesas o começo de um mundo. Para as tribos indígenas que habitavam o planalto e desciam pelo Peabiru para o litoral no inverno ali também era o início de um mundo. O mundo salgado e aquático de espumas revoltas que expele homens brancos ocasionais.
Costumamos pensar a partir de dentro, mais facilmente, as fronteiras distantes. Linhas imaginárias pendentes sobre rios longínquos, tracejadas sobre o mar aberto, descontínuas nos desertos, finíssimas no solo úmido das matas selvagens, grafadas com precisão em extensos espaços ortogonais de solidão. Sob elas correm eventualmente outras linhas supostamente mais concretas como formatos engenhosos e variados: cercas elétricas, grades, minas, linhas de laser, arames farpados, valas, muros e baterias de mísseis.
Muito mais raramente percebemos as fronteiras das cercanias, excessivamente familiares, demasiadamente próximas e presentes para perturbarem nossos limiares perceptivos. Estão tão dissolvidas em uma plácida permanência perpétua, tão arcaica e profundamente assimilada, que se internalizam inabaláveis e intransponíveis.  
Michel Serres (2014) nos conta que durante uma madrugada em 1995, um forte terremoto derrubou as grades das jaulas do zoológico de Kyoto, no Japão. Surpreendentemente não houve uma debandada geral dos animais selvagens. Os animais nem se moveram, na verdade. Estavam tão acostumados àqueles limites incontestáveis que nem mesmo ensaiaram confrontá-los para testarem uma vez mais sua óbvia permanência. Fato é que caíram as grades reais, não as imaginárias. Essas são muito mais persistentes.
Conseguiremos reconhecer nas várias escalas, entre os lugares que nos envolvem e os espaços que imaginamos, as fronteiras que nos cercam? Seremos capazes de nos mover entre elas e captar imagens fotográficas de suas manifestações sensíveis? Serão todas visíveis, representáveis, afinal? Podemos experimentá-las, dilatá-las, reconfigurá-las, descontruí-las, ultrapassá-las?
Estas reflexões preliminares reorganizam o mote do III Seminário REPRESENTAR para uma experiência coletiva de derivas urbanas fotográficas que podem ser realizadas de maneira não-coordenada e assistemáticas, em diferentes cidades brasileiras, tendo como campo de convergência o ambiente colaborativo de imagens ARQUIGRAFIA < www.arquigrafia.org.br > e a hashtag #representar2015 .
A partir de convites feitos via Web aos usuários atualmente cadastrados e a novos usuários em potencial essa atividade irá envolver ações e reflexões diretamente sobre a plataforma ARQUIGRAFIA: uploads, intercâmbio, registro de impressões, formulação de comentários e a análise conjunta de uma constelação original de imagens digitais.
Espera-se que essa proposta contribua com os objetivos do Seminário de compartilhar experiências com diferentes óticas de abordagem sobre o problema das representações da arquitetura, do urbanismo e do design na conjuntura técnica e social contemporânea a partir de ensaios aproximativos, experimentais e interrogativos que se valem do deslocamento do olhar, da fotografia digital e das práticas colaborativas na Web.      

Referências bibliográficas:
BORGES, Jorge Luis. O Outro. In: O Livro de Areia. Tradução: Davi Arrigucci Jr. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
FOCILLON, Henri. Vie des Formes. Paris: PUF, 1981.
HEIDEGGER, Martin. Construir, habitar, pensar. In: Ensaios e Conferências. Tradução: Márcia de Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 2002.

SERRES, Michel. Jungle dans la ville. In: Nouvelles du monde. Paris : Flammarion, 2014.

Título:  ARQUIGRAFIA de linhas imaginárias
Professor Responsável: Artur Simões Rozestraten
Pós-graduandos colaboradores: Juliano Carlos Cecílio Batista Oliveira - Núcleo de Linguagem, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Design, Universidade Federal de Uberlândia - UFU
Rodrigo Luiz Minot Gutierrez – UNIUBE
Daniele Queiroz dos Santos – Grupo de Pesquisa CNPq ‘Representações: imaginário e tecnologia’ - FAUUSP
Apoio e parcerias:
FAPESP (2012/24409-2)
RELAB – Laboratório de Representações da FAUUSP
NaWeb – Núcleo de Apoio à Pesquisa em Ambientes Colaborativos na Web
Grupo de Pesquisa CNPq ‘Representações: imaginário e tecnologia’
Instituição: FAUUSP
Local: vários e diversos em diferentes cidades brasileiras
Duração: entre 03 e 21/11/2015
Data e horário do WS: a critério dos interessados
Público alvo: estudantes de arquitetura e urbanismo, estudantes de design, de artes plásticas, de artes visuais, de história, de geografia, de psicologia, de filosofia, das engenharias, de ciências sociais, de arqueologia, de antropologia, de música, de dança, de artes cênicas, de letras, arquitetos, fotógrafos, professores e leigos interessados no tema.   
Vagas disponíveis: ilimitadas e gratuitas, sem necessidade de inscrição prévia.
Base web: www.arquigrafia.org.br  hashtag: #representar2015

Imagem: Vale do Anhangabaú, São Paulo - Larissa França (09/2014)

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