Pular para o conteúdo principal

Salão de Cabeleireiro em Orlândia [SPBR]


Uso misto é quando um lote urbano é ocupado com uma atividade dupla, geralmente comercial e de habitação. Tal programa de necessidades é muito comum em nossos centros urbanos: edifícios em que os próprios lojistas moram, trabalhando no térreo e morando no pavimento superior. A tipologia é secular, e absolutamente banal do ponto de vista arquitetônico. Será?


Antes mesmo de fundar o escritório SPBR, o arquiteto Angelo Bucci já projetava, aqui e alí, edifícios interessantes em sua cidade natal de Orlândia. Obras apoiadas conceitualmente no partido modernista, influenciadas pela talentosa geração de arquitetos brasileiros da segunda metade do século XX (os óbvios Vilanova Artigas e Paulo Mendes da Rocha, e também influências menos perceptíveis, como Eduardo de Almeida, Rodrigo Lefèvre e Affonso Eduardo Reidy). Passando por momentos de trabalho individual, e em diferentes escritórios e parcerias, Angelo é responsável pelos edifícios mais intrigantes da pequena cidade do norte do estado.
Um Salão de Cabeleireiro, um dos últimos projetos concluídos, não é exceção.


A fachada absolutamente simples reflete a solução adotada: o salão, que ocupa o pavimento térreo, tem sua estrutura independente do pavimento superior, a residência.


Não apenas isso: as lajes de cobertura do salão, e do piso da casa são diferentes, criando uma fenda, um descolamento. Enquanto a laje do salão é apoiada em esbeltos pilares metálicos, a laje do piso da residência é pendurada através de tirantes à laje de cobertura, que por sua vez se estrutura nas empenas laterias e em uma viga invertida (um sistema similar aos projetos das casas em Ribeirão Preto e Ubatuba).


A relação entre ambos os programas se estabelece através dos rasgos de luz, nos intervalos das lajes, e o espelho d´água na cobertura do salão (solução também bastante utilizada em outros projetos, como na Casa em Aldeia da Serra). O desenho "ânguloso" dos pisos deixa espaço para áreas verdes, que junto com os grandes panos de vidro, ora translúcidos, ora serigrafados, estabelece continuidade visual na área de trabalho, sem que isso atrapalhe a residência logo acima, conservando a privacidade de seus moradores.




Apenas 3 pilares estruturam o pavimento superior, passando pelos dois andares. Os fechamentos, com vidros fixos (apoiados nas lajes pelo lado de fora através de peças metálicas) e painéis de madeira estabelecem leveza às fachadas. Um detalhe curioso é a a abertura quadrada de algumas janelas de madeira, uma escolha que remete claramente ao imaginário da casa: a janela de madeira quadrada, que se abre para a rua, para o pátio, para os fundos do lote.


O acesso à residência se dá através de rampas, localizadas de maneira quase oculta, para que os clientes do salão mal as percebam.




A planta da casa é resolvida de maneira similar à Casa em Ribeirão Preto, em formato de U, com a cozinha no centro, intermediária aos quartos e living. O pátio, com pisos apoiados na laje inundada, proporciona iluminação a todas as áreas, que poderiam ficar prejudicadas pela falta de recuos laterais.


O programa corriqueiro oferece a possibilidade de novas relações entre trabalho e casa. Através de conceitos simples, o escritório SPBR apresenta novas possibilidades de reflexão sobre essa tipologia.
Reflexão que transborda em outros projetos, a aparecer logo por aqui.


Vimos aqui. Fotos do sempre talentoso Nelson Kon.

Comentários