Pular para o conteúdo principal

Reflexões que levam ao presente


         Vinda de uma sucessão de posturas de composição, a Arquitetura entrava no século XX capaz novamente de questionar o ambiente construído e acompanhar as novas tecnologias e pensamentos. O movimento moderno era uma causa, capaz de gerar um processo pelo qual forma e função eram indissociáveis um do outro.
         Com o correr do século, foi tornando-se claro o fracasso da causa que se tornou estilo. A máquina moderna deveria ser capaz de resolver os problemas sociais. Porém, como uma arquitetura que tem a pretensão de ser global poderia resolver problemas locais? Seria a arquitetura moderna desprovida de contexto?

Não existe contexto na Villa Savoye?

Não existe contexto na Casa do Baile da Pampulha?

             É muito óbvio agora, décadas depois, que o Moderno era mesmo uma utopia, por isso mesmo impossível de se realizar sem entrar em contradição.
           E essa contradição é observada por uma série de arquitetos nos anos de 1960 que, num caminho contrário ao presumido movimento “morto”, alimentam o pós-modernismo. Robert Venturi exalta o consumismo e simbolismo das strips de Las Vegas, enquanto Aldo Rossi nos remete à memória do lugar, ao contexto urbano “ignorado” pelo modernismo.
       O pós-moderno vai tomando forma, em parte emprestada dos antigos estilos arquitetônicos do passado, na pesquisa de antigos e novos materiais, na criação de uma imagem que se relaciona com símbolos. Charles Moore vai criar sua Piazza d’Italia utilizando-se de frontões e colunatas romanas de aço inoxidável. Venturi, em contrapartida ao “Less is More” de Mies van der Rohe, vai dizer que “Less is a Bore”, exaltando o exagero e complexidade em seus edifícios. Complexidade essa que é apenas reflexo da cidade contemporânea, onde edifícios minimalistas modernos não poderiam ter relação alguma.
          Em paralelo, arquitetos que ainda acreditam no modernismo como postura projetiva, trabalham na interdisciplinaridade de resolver um programa que gera uma forma. Em tempos de incerteza e multiplicidade, os herdeiros do movimento moderno caminham lado a lado com o pós-modernismo. Arquitetos como Álvaro Siza e Rafael Moneo, buscam o objetivo de conciliar o moderno com o contexto, enquanto arquitetos como Frank Gehry e Rem Koolhaas dialogam com o contexto de maneira a criar uma relação, aparentemente inexistente, cujo reflexo é tão descontínuo e contraditório como a cidade contemporânea.

           A arquitetura era antes moderna, mas o homem nunca foi moderno. Talvez o maior fracasso do moderno seja o que alimentou o exagero do pós-moderno. Exagero esse que trouxe novamente à mesa questões e indagações importantes: qual é o papel da arquitetura nos dias de hoje? É o de criar símbolos, ou resolver programas de necessidade?


Foto da Villa Savoye por Stephanie Soetendal.
Foto da Casa do Baile da Pampulha tirada em 06/2008, por Larissa França.
Fotos de casa pós-moderna descontextualizada de 03/2012, por Fernando Gobbo.

Comentários

  1. A pergunta final já embute uma resposta, pelo óbvio. Apenas deve-se levar em conta as ocasiões de se criar símbolos. Há momentos em que cidades e espaços públicos pedem símbolos. Harmonizá-los com o programa de necessidade é o grande desafio. Poucas das belas construções bem resolvidas volumétricamente atendem aceitavelmente aos programas. O fachadismo age de modo obsessivo - e somente assim consegue se impor plenamente.

    Há um aspecto que me parece obstruir esse debate e confundí-lo: é o termo "moderno". Não vejo Moneo nessa categoria. Aliás, a própria categoria é difusa, abrangendo desde Aalto e Wright até Niemeyer e Mendes da Rocha. Penso que há subdivisões e não compreendê-las torna o debate pouco produtivo.

    Como comparar Márcio Koogan com Niemeyer? Um usa volumetria curva, sinuosa, cria perspectivas arrebatadoras etc. O outro foca com esmero exacerbado o detalhamento e cuidado de materiais para criar ambiência rica, mas num esmero já chamado por alguns como arquitetura de interiores no exterior. Mendes da Rocha difere muito de Reidy, que difere de outros mestres europeus, ainda que membros desta grande barca chamada de "modernismo".

    A escala temporal precisa ser considerada. Aprendemos com a professora Eunice Abascal que o mesmo Gehry bem sucedido em Bilbao, torna-se tedioso no Walt Dsney Concert Hall. A diferença não é o partido nem o arquiteto: é o espaço-tempo.

    Assim penso que o arquiteto deve atender seu cliente de modo digno. Seja ao propor uma arquitetura cenográfica, emocionante, seja criando artesanalmente soluções inteligentes de acesso e de implantação. Uma coisa parece unânime: poucos querem ser "pós-modernistas", no sentido histriônico do termo. Mas sentem-se tentados pela arquitetura "fluída", "genética" e de outros termos que pululam nas aulas de teoria.

    ResponderExcluir
  2. Caro Carlos,

    Concordo com você quanto a esse ponto de vista.
    No entanto, acho que o termo "moderno" deve ser entendido como uma postura projetiva e uma maneira de enxergar nossa profissão como importante construtora de uma interface com a sociedade.
    A verdade é que essa conotação se perdeu na história, e o moderno tornou-se um estilo, com m minúsculo.

    Se pensarmos dessa forma, da para comparar muito bem todos os arquitetos que citou. Mesmo o Kogan, e seus flertes com o pós-modernismo (vide o Hotel Fasano), sempre manteve uma postura crítica com sua arquitetura, ainda que irônica de vez em quando.
    O importante para todos esses arquitetos, creio, foi um programa bem resolvido, com fracassos e sucessos.

    Creio que poucos querem ser pós-modernistas justamente por que ninguém sabe ao certo o que é sê-lo. Éolo Maia já dizia isso.
    Apesar da dificuldade em definir quem é isso ou aquilo, não nos esqueçamos que existe o bom pós-modernismo, e o mal modernismo.

    ResponderExcluir
  3. Vide as contribuições de Aldo Rossi, Robert Venturi e Denise Scott Brown.

    As duas fotografias que ilustram a postagem, que tirei num lugar x aqui de Ribeirão Preto, mostram uma casa cor-de-rosa absolutamente pós-moderna, e que ao meu ver, é infinitamente mais interessante que as casas em "estilo moderno" vizinhas.
    Vejo as colunatas clássicas que o muro esconde e me confundo se gosto ou não da casa. As vezes penso que gosto de partes dela.

    Fernando.

    ResponderExcluir

Postar um comentário